sexta-feira, outubro 12, 2007

O Poema

O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem

O
poema alguém o dirá

Às searas

Sua passagem se confundirá
Como rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo


In "Livro Sexto" – 1962

Sophia de Mello Breyner Andersen
(1919 – 2004)

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